Europa vive disputa política que supera divisão direita/esquerda
PROFESSOR GIORGIO ROMANO ESPECIAL PARA A FOLHA DE SÃO PAULO
A eleição do Parlamento Europeu, na semana passada, reforçou, de forma dramática, a necessidade de revisão do Pacto de Estabilidade, que obriga os países da União Europeia (UE) a priorizarem o rigor fiscal em relação às políticas de estímulo à geração de trabalho e renda.
A persistência de alto desemprego combinado com a perspectiva de crescimento econômico vegetativo, na melhor das hipóteses, gerou uma percepção generalizada de que "Bruxelas", sede do bloco, é parte do problema, não da solução.
Confunde-se facilmente a crítica radical às políticas econômicas da UE com sentimentos nacionalistas "anti-Europa" de vários tipos.
O que esteve em jogo nas eleições europeias não foi somente a clássica disputa Fla-Flu, ou seja, entre a centro-direita e a centro-esquerda, mas também outra, mais complexa, entre os que apostam na Europa e os chamados eurocéticos.
Registrou-se um tsunami no Reino Unido e na França.
Em ambos os países houve uma dupla derrota: partidos ultranacionalistas, radicalmente contra a União Europeia, ganharam as eleições. E os partidos no governo ficaram em terceiro lugar.
Os mais novos membros da UE, do Leste Europeu, registraram percentagens de absenteísmo entre 70% e 80%, com recorde na Eslováquia, que teve 87% não votantes, ou seja, acima da média, de 57%, já bastante alta.
O quadro, porém, é mais complexo do que parece.
Frustrou-se o esperado avanço dos eurocéticos na Holanda e na Itália, e é pouco provável que a Frente Nacional de Marie le Pen consiga articular uma coligação com influência de fato no poder legislativo europeu.
Houve outros tsunamis, na Grécia e na Itália.
No primeiro, o agrupamento de esquerda radical, Syriza, ganhou as eleições com 26% dos votos, três vezes mais que a extrema direita.
É liderado por um jovem carismático, Alexis Tsipras, que não defende a saída da Grécia da Europa nem do euro, mas é radicalmente contra a política de austeridade.
Na Itália, outro jovem carismático, o premiê de centro-esquerda Matteo Renzi, teve uma vitória histórica com 41% dos votos.
Renzi defende o que denomina política keynesiana de investimento público e, para isso, reivindica o direito de deixar fora do cálculo do limite de deficit público de 3% do Pacto de Estabilidade os gastos com educação, pesquisa e desenvolvimento.
Renzo sabe, e declarou, antes e depois das eleições, que a Itália somente vai conseguir sair da crise com uma reforma das políticas europeias.