Ex-Senador da Itália debate rumos da Europa na UFABC

José Luís Del Roio, brasileiro exilado na Itália por trinta anos e ex-Senador no país, mostra como a crise econômica abala as bases do Estado de Bem Estar Social e deixa países a mercê das turbulências do mercado financeiro

“A União Europeia vive uma crise extremamente séria, com a subordinação de seus 27 países às designações do Banco Central Europeu e das políticas de austeridade que apenas aprofundam essa crise”. A opinião é de José Luis Del Roio, ex­ senador da República italiana, entre 2005 e 2008. Na quarta-feira (29), ele esteve na Universidade Federal do ABC, campus de São Bernardo do Campo, proferindo a palestra "Europa, unida para onde?". O evento contou com o professor Giorgio Romano Schutte como coordenador da mesa.

Del Roio sintetizou as características gerais do continente e a sequência de iniciativas e decisões que marcaram a construção da UE nas últimas décadas. .

Para o ex-parlamentar e jornalista, a região enfrenta uma situação de virtual “golpe de Estado”. Segundo ele, um golpe é mais eficaz quando as pessoas não percebem sua ocorrência, o que enfraquece possíveis oposições. “Passado algum tempo, quando as populações realmente se derem conta do que ocorreu, o golpe já estará solidificado”, assinala Del Roio.

Expansão

A princípio poucos países compunham a UE e sua expansão se deu realmente na década de 1990, a partir da desagregação da URSS e da intensificação de várias políticas de livre-comércio. A Alemanha - maior economia da região –, apoiada por outros países, acabou tendo um papel preponderante na construção do bloco, com a adoção de uma moeda única e diversos acordos de cooperação.

Com o Tratado de Maastricht, em 1992, além de assumir o nome atual, a UE acabou por consolidar a aplicação do neoliberalismo na Europa. Fazendo uma ligação com a idéia do golpe, Del Roio assinalou que a Constituição Européia, mesmo sendo rejeitada em plebiscito por diversos países – pelas condicionalidades econômicas que impunha a cada um deles -, foi aprovada em diversas comissões de cúpula regionais. “Isso nos mostra a complexidade de se governar 27 nações diversas, com uma multiplicidade grande de pontos de vista”. Ali, segundo o palestrante, se materializaria um golpe de Estado.

Estado de Bem Estar

Em 2008, com a crise econômica internacional, o Estado de Bem Estar Social – marca distintiva das redes de proteção nas áreas de educação, saúde e previdência - sofreu pesadas perdas. Os orçamentos públicos encolheram e rígidas políticas de austeridade foram adotadas por vários países. Isso tem gerado manifestações populares de protesto e um aumento da concentração de renda.

Junto com a crise financeira o poder político e econômico também se concentrou. Segundo Del Roio, “Os sete integrantes da direção do BC Europeu decidem a política econômica de todo o continente”.

Quando questionado sobre o papel da Alemanha na crise, o ex-senador foi enfático ao dizer que o país não está sustentando os demais integrantes da UE, como a imprensa pode sugerir, e sim explorando os países da periferia do continente. “Dessa forma, a Alemanha tem seu mercado garantido e acumula mais capital”. Del Roio ainda menciona a situação dupla que o país vive: apesar de localizada na Europa e tendo os países europeus como mercado consumidor, seu futuro está ligado a diversos acordos e parcerias estratégicas estabelecidos com a Rússia.

A palestra contou ainda com a presença de Leonardo Ditta, professor aposentado da Universidade La Sapienza, de Perugia e Roma, que agregou informações econômicas adicionais. Sua critíca parte da constatação que a economia liberal não funciona, já que os mercados não são infalíveis e nem podem ser o centro organizador da dinâmica da vida pública. .

Com a participação de cerca de 120 estudantes, além de diversos professores, a discussão também se voltou para as atividades do Tribunal Europeu de Direitos Humanos de Estrasburgo, além de temas como o papel da mobilização social e da imigração, as tensões separatistas perceptíveis em diversos países e a impossibilidade de algumas regiões seguirem o modelo proposto pela UE.

A grande questão que permeou a palestra, Europa unida para onde?, permanece sem resposta consensual apesar de ser nítido que o projeto europeu de desenvolvimento equilibrado dá mostras claras de esgotamento.

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