PARA O DEBATE: Os Crimes do Ditador da Síria e o Tribunal Penal Internacional

OS CRIMES DO DITADOR DA SÍRIA E O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Jose Blanes Sala

Causa estranheza que até hoje o Tribunal Penal Internacional não tenha adotado nenhuma medida, nem sequer de citação, a respeito dos crimes contra a humanidade pretensamente perpetrados pelo ditador Bashar al-Assad; assim como em seu momento o fez contra o ditador líbio Muammar Kadhafi, expedindo uma ordem de prisão a fim de obter o seu comparecimento perante o referido Tribunal.

 

Nalguns jornais divulgou-se a informação de que pelo fato da Síria não ter assinado o Estatuto de Roma, o tratado internacional que institui o Tribunal Penal Internacional, não se poderia submeter o ditador aos seus ditames. Nada mais falso, o Tribunal possui competência para julgar qualquer crime que esteja tipificado no Estatuto, não é necessário que o criminoso faça parte dos Estados que assinaram o referido tratado. Essa é, aliás, a força e a grandeza da iniciativa internacional, caso contrário não possuiria muita eficácia. Outra questão é que, de fato, os Estados que não assinaram ou não ratificaram o Estatuto não se comprometem a colaborar de forma efetiva com as suas decisões e seus procedimentos. É o que acontece, por exemplo, com os Estados Unidos...

Até dezembro de 2012 já tínhamos 120 Estados que assinaram e ratificaram o Estatuto de Roma. Rússia e China assinaram mas não ratificaram ainda... Os Estados Unidos assinaram na gestão do presidente Bill Clinton, mas na gestão subsequente de George W. Bush retiraram a assinatura. Quem sabe fosse oportuno nos dias de hoje que o atual presidente se comprometesse a aderir ao tratado; mas depois do assassinato de Osama Bin Laden perpetrado por agentes norte-americanos e ainda com a disciplina pendente com relação a Guantánamo creio que poucas esperanças devemos aninhar.

O fundamento principal que justifica o Tribunal Penal Internacional é que quando o indivíduo, que comete crime internacional, é agente do Estado, não haverá penalização do Estado, pelo Direito Internacional, mas as consequências penais, decorrentes da conduta criminosa, serão imputáveis a seu autor. É por isso que a Síria não precisa nem sequer ter assinado o Estatuto de Roma para que Bashar al-Assad possa ser denunciado e se instaure um processo para a apurar a sua conduta.

Mas a pergunta remanesce ainda sem resposta: por que até hoje esta medida não foi adotada? Falta de provas? Com certeza não é o caso, pois está mais do que claro que, em repetidas ocasiões, o Presidente da Síria ou ordenou ou anuiu com a decisão de agredir os civis de forma desproporcional e injustificada, incorrendo assim em crime contra a humanidade, definido como assassinato, exterminação, redução à escravidão, deportação e qualquer outro ato desumano cometido contra populações civis antes e durante a guerra, em seu primeiro parágrafo.

Talvez uma das respostas, penso que não deve ser a única, é que os países que fazem parte do núcleo duro do Conselho de Segurança da ONU, como são a China, a Rússia e os Estados Unidos não fazem parte dos compromissos do Estatuto de Roma e, em contrapartida, fazem parte de muitos interesses envolvidos no conflito. Interesses que, a diferença da Líbia, não convêm deixar à mostra de uma forma tão clara e que ainda – até quando? - não configuram uma ameaça tão grave à paz mundial...

Até quando? Para Turquia, Israel e inclusive o Egito esta omissão começa a ser muito incomoda.

José Blanes Sala é professor e vice-coordenador do Curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC.

 
 
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