Audiência com o Ministro de Relações Exteriores
Professor Giorgio Romano, coordenador do BRI participou de audiência com o Ministro de Relações Exteriores, Embaixador Mauro Vieira no Itamaraty junto com outros integrantes do Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais (GR-RI) no dia 25 de junho de 2015. Em pauta estavam os desafios da política externa brasileira e as propostas do GR-RI para ampliar os mecanismos de participação da sociedade civil. Na ocasião o Ministro recebeu um exemplar do livro editado pela UFABC "2003-2013 Uma Nova Política Externa" que sistematizou os debates da Conferência Nacional realizada na UFABC em julho de 2013 com o mesmo nome. Da delegação do GR-RI participou a Professora Maria Regina Soares Lima da UERJ e por parte do Itamaraty o Embaixador Julio Glinternick Bitelli. O Ministro Mauro Vieira expressou seu interesse em conhecer a UFABC e se dispôs a participar de um debate em data a marcar.
PARA O DEBATE: A crise no Mediterrâneo à luz da situação mundial dos refugiados
A crise no Mediterrâneo à luz da situação mundial dos refugiados
Por Julia Bertino
As recentes notícias retratando a tragédia humana no mar Mediterrâneo, com barcos abarrotados de migrantes após realizarem uma arriscada travessia a fim de atingir o velho continente, suscitam importantes pontos para a reflexão.
Segundo dados disponibilizados pelo ACNUR¹, apenas nos cinco primeiros meses deste ano foram contabilizadas 1.850 mortes e 105.000 pessoas que tiveram êxito, das quais 55.000 entraram na Itália e quase 48.000 na Grécia. Mais de 85% dos que chegaram em território grego são provenientes de países assolados por conflitos, como: Síria, Afeganistão, Somália e Iraque. Há de se registrar que 53% da população mundial refugiada atualmente² é constituída tão-somente por sírios (3,8 milhões), afegãos (2,5 milhões) e somalis (1,1 milhão) – sendo a maioria acolhida em países vizinhos.
Estas são, portanto, pessoas fugindo de situações de violência, marcadas por perseguições e outras violações de direitos humanos, buscando preservar, sobretudo suas vidas – o que os enquadra na categoria jurídica de refugiado. Muito tem se debatido na área das migrações internacionais acerca da distinção conceitual entre migrante e refugiado. Grosso modo, em que pesem as críticas, entende-se que o migrante se desloca em função da situação econômica no país de origem, à procura de melhores oportunidades de vida no país de destino. Ao refugiado, em contrapartida, não haveria escolha ou opção, já que ele não pode regressar à terra natal, devido a conflitos e instabilidade política interna. Os refugiados seriam, assim, tidos como os reais merecedores de proteção internacional.
Contudo, colocam-se em pauta as efetivas condições de que essas pessoas tenham acesso ao refúgio. Isso significa que: aqueles forçados a deixar os seus lares, após vivenciarem processos de violência generalizada, correm o risco de ter negada a possibilidade de sobrevivência.
Como bem constatou Hannah Arendt, ao abordar os movimentos migratórios no contexto pós-Primeira Guerra, “quando perdiam os seus direitos humanos, perdiam todos os direitos: eram o refugo da terra"³. Vistos como indesejáveis, os refugiados oriundos de países da África, Ásia e do Oriente Médio em direção a países da Europa trazem consigo bagagens e repertórios sociais, culturais, linguísticos, religiosos, além de aspectos étnico-raciais não tidos como compatíveis àqueles compartilhados pelas sociedades de acolhimento – que, diga-se de passagem, podem não ser muito acolhedoras.
Na véspera do Dia Mundial do Refugiado, a ser rememorado amanhã (20/06), tais apontamentos nos levam a questionar as possibilidades concretas dessas pessoas de fato serem recebidas como refugiadas e poderem traçar novos caminhos rumo à reconstrução de suas vidas e ao pleno desenvolvimento de suas potencialidades nas sociedades receptoras.
Em tempos náufragos, vale resgatar, por fim, o significado dos aclamados versos de Pessoa: “Deus ao mar o perigo e o abismo deu, mas nele é que espelhou o céu”.
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¹UNHCR. Special Mediterranean Initiative: plan for an enhanced operational response. June-December 2015. Disponível em: <http://www.unhcr.org/cgi-bin/texis/vtx/home/opendocPDFViewer.html?docid=557ad7e49&query=mediterranean>. Acesso em: 17 jun. 2015.
²UNHCR. Global trends: forced displacement in 2014. 2015. Disponível em: <http://unhcr.org/556725e69.html#_ga=1.188867758.444355445.1393506422>. Acesso em: 18 jun. 2015.
³ARENDT, Hannah. As Origens do Totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 300.
Julia Bertino Moreira é Professora no Curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC
Eles se atreveram - a revolução russa de 1917
A Revolução Russa de 1917 foi o acontecimento mais significativo do século 20. Num lance de audácia, o Partido Bolchevique, liderado por Lênin, conquistou o poder político e deu início à construção de um Estado que se propunha a superar o capitalismo, no maior país do globo em extensão territorial. A vitória dos comunistas russos inspirou um longo ciclo de revoluções ao redor do mundo, provocando reações que moldaram as relações internacionais, primeiro com o fascismo e, após 1945, com a Guerra Fria.
Debatedora: Prof. Dr. Gilberto Maringoni (UFABC)
Dia: 18 de junho (quinta-feira)
Local/Horário: Auditório Principal - SBC / às 15h
Palestra: O Futuro do Mercosul
O BRI organizou, em 9 de junho de 2015, em parceria com o Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais (GR-RI) um debate sobre o Futuro do Mercosul. Participaram da mesa, Miguel Rossetto, Ministro-Chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Dr. Rosinha, Alto Representante do Mercosul e o Reinaldo Salgado, Diretor do Departamento Mercosul do Itamaraty. Em auditório lotado com aluno, professores e convidados externo forma apontados os avanços, entraves e perspectivas futuras do Mercosul.
PARA O DEBATE: A Contribuição do Acordo de Desminagem ao Processo de Paz Colombiano
A Contribuição do Acordo de Desminagem ao Processo de Paz Colombiano
Por David Morales
As negociações do processo de paz entre as FARC e o governo colombiano, iniciadas em La Habana em novembro de 2012, atravessaram na primeira semana de junho de 2015 um singular paradoxo. Enquanto se consolidava uma intensa crise que fragilizava o cessar fogo unilateral vigente desde dezembro de 2014 e proposto pela guerrilha, ao mesmo tempo se anunciava o sucesso do primeiro desmantelamento de minas terrestres como resultado do Acordo de Cooperação de Desminagem Conjunta entre o exercito colombiano e as FARC.
A crise estabelecida teve suas origens pelas recentes ações bélicas dos grupos beligerantes. O governo atacou posicionamentos das FARC gerando baixas de 40 guerrilheiros como resposta à emboscada da guerrilha que, no mês de abril, tinha perpetrado ataque a uma tropa de 11 soldados. As negociações ficaram paralisadas e uma onda de hostilidade e ameaças tomou conta do processo negociador. No entanto, o que poderia ter sido a maior crise do processo de paz com profundas consequências políticas e sociais para o país, paradoxalmente foi o momento da constatação do primeiro resultado de avanços na destruição de minas terrestres, de conformidade com o Acordo de Desminagem Conjunta de 7 de março de 2015, o qual estabelecia um prazo exato de três meses para publicar os primeiros resultados dessa ação conjunta entre as partes envolvidas.
O Acordo de Desminagem é completamente inovador pelo fato de colocar guerrilheiros e militares em um mesmo lado para favorecer pela primeira vez, de forma conjunta, o bem estar da população. O Acordo estabelece a participação proativa da guerrilha em fornecer os mapas com as coordenadas da localização exata das minas em várias regiões do país, e por sua vez, a logística tecnológica que o exercito possui para a respectiva destruição. Este processo exige uma aproximação entre os dois lados combatentes para deixar de lado as armas e agressões, e passar a gerar uma simbiose de confiança necessária para poder implementar o processo de retirada e destruição das minas explosivas.
Interessante observar que esse processo de aproximação e geração de confiança durante os últimos três meses, se deu na lógica de colocar a segurança humana como prioridade acima dos interesses conflitantes que ainda são bastante expressivos. O fato de exigir dos atores um maior compromisso na criação de condições que garantam a segurança e tranquilidade dos moradores das áreas rurais nas quais os explosivos foram espalhados estrategicamente, repercute na necessidade dos habitantes sair do confinamento ao qual foram submetidos, e voltar para suas terras com a garantia de que não encontrarão mais ameaças de morte semeadas. É por isso que o Direito Internacional Humanitário condena o uso de minas terrestres em conflitos pelo fato de envolver uma camada da população completamente frágil (principalmente crianças) além de violentar completamente a dignidade e moralidade humana.
No entanto, os dados oficiais demonstram como esse problema ainda é uma ameaça total para os moradores dos quase 700 municípios, nos quais se acredita que repousam silenciosamente mais de 300 mil minas esperando suas vitimas para destruí-las. Segundo dados do Programa de Ação Integral contra as Minas (2015) desde 2001 têm sido desativadas mais de 100 mil minas, porém, aproximadamente 12 mil vitimas têm sofrido o ataque traiçoeiro e destruidor. Esses dados colocam a Colômbia como o terceiro país com maior número de afetados por este flagelo.
Por outro lado, a cooperação internacional nesse processo de destruição de minas terrestres tem sido bastante expressiva, porém com pouca repercussão. A ONG Ajuda Popular da Noruega (APN) tem acompanhado o processo de aproximação entre os atores em conflito e igualmente garantido a transferência de informação fornecida pela guerrilha sobre a localização exata das minas explosivas. Também têm participado observadores do Tratado de Ottawa, regime internacional que demanda dos países a proibição do uso, armazenamento, produção, transferência e estocagem das minas. No entanto, os maiores produtores deste armamento ainda não têm aderido à convenção e continuam comercializando as minas. Como decorrência do Acordo, a primeira experiência de desminagem conjunta se materializou nessa primeira semana de junho com um resultado bastante positivo. Pela primeira vez, depois de 50 anos de conflito, um batalhão do exercito e as FARC, em forma conjunta, iniciaram ações com o objetivo de favorecer à população que tem sido afetada de forma intensa.
No entanto, existem ainda desafios para materializar o objetivo final de atingir o desarmamento total e compreensivo das minas terrestres na Colômbia. O primeiro deles, o número elevado de municípios que devem ser desminados. Isso representa uma alta exigência cartográfica do Estado para lograr mapear todas as regiões e em cooperação com a guerrilha, a plena identificação das áreas onde as minas se encontram. Um segundo desafio deriva do anterior e está relacionado com o elevado custo que a desminagem humanitária representa para as contas do Estado, entendendo que tal processo pode se arrastar por mais de uma década. Um terceiro desafio radica na dificuldade de desmantelar territórios com plantações de coca e que se encontram poluídos de minas. Até que ponto a guerrilha estaria disposta a entregar áreas que, até então, são do seu pleno domínio? Cabe salientar de que a destruição de minas está sendo implementada em municípios de baixa intensidade de conflito, mas não assim nas regiões que ainda representam focos de tensão máxima e palco de confrontos entre os bandos beligerantes.
Por último, mesmo que o Acordo de Desminagem esteja dando frutos e seja interpretado como o começo do fim do conflito colombiano, existe um problema de fundo ainda sem previsão de resolver. Apesar da cooperação impar entre a guerrilha e o exercito na destruição das minas, há uma dúvida com relação à reparação de danos às vitimas do conflito. Ainda falta muito para se discutir e construir o modelo de justiça transicional que será aplicado no cenário pós-conflito. Como e por que tantas minas foram semeadas nas regiões mais vulneráveis do país? Quem forneceu tais armamentos já prontos, ou os artefatos e peças para a sua fabricação caseira? Quais os responsáveis pelas ordens e pela implantação destes armamentos? A vantagem é que esta experiência de cooperação entre os atores trouxe um novo fôlego, deixando o processo de paz em um ponto praticamente sem retorno. Por tanto, a superação dos desafios mencionados e o esclarecimento dos questionamentos colocados serão vitais para o amadurecimento e a materialização do processo pacificador na Colômbia nessa nova fase que se inicia.
David Morales é professor no Curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC